A Casa do Povo de Campo Maior, sob a orientação do Capitão César Augusto Correia, viria a retomar o velho sonho de se construir um campo de futebol em Campo Maior. Este senhor era de origem beirã e viera casar em Campo Maior onde se estabeleceu desempenhando as funções de comandante da Companhia da Guarda Fiscal de Elvas. Em 17 de Setembro de 1937 foi empossado como Presidente da Assembleia Geral e trouxe à gestão da Casa do Povo, uma nova dinâmica sob o impulso de grandes preocupações sociais.
Muito impressionado com o carácter sazonal dos trabalhos agrícolas no Alentejo que, devido aos regulares e prolongados períodos de paragem, condenavam os trabalhadores rurais a uma situação persistente de grande miséria, entendia que a Casa do Povo, no cumprimento dos seus princípios legais, devia desenvolver projectos que garantissem trabalho e proventos aos trabalhadores nos períodos em que o trabalho nos campos era mais escasso.
Assim, pouco tempo depois de tomar posse, fez aprovar pela direcção um plano de obras a adoptar pela Casa do Povo no qual constava a decisão de proceder à terraplanagem indispensável para o campo provisório de foot-ball no ferragial da mesma Casa do Povo.... desde que o aludido projecto fosse sendo realizado em épocas de falta de trabalho e de crise.... que impedisse os trabalhos rurais, fornecendo os sócios protectores (os proprietários rurais) transportes gratuitos e os sócios efectivos (trabalhadores assalariados) a sua comparticipação de trabalho também gratuitamente, o que significa que o capital cessaria de fugir ao sacrifício e o trabalho aceitaria um novo esforço.
Esta decisão, segundo o Capitão César Augusto Correia, vinha ao encontro do que devia ser a legítima vocação das Casas do Povo. Estas directivas têm por objectivo os fins estabelecidos no Decreto-Lei 23.051 de 23 de Setembro de 1933 que cria as Casas do Povo, pois no seu parágrafo 2º do Artº 13º determina-se textualmente que as verbas do Cofre da Casa do Povo devem ser atribuídas para pagamento de salários dos sócios efectivos em épocas de falta de trabalho e constituirá o seu processo principal de combate ao desemprego. (Acta nº29 de 18/11/37)
Assim, as obras de terraplanagem serão feitas segundo o regime de cinco dias de trabalho pago e mais um gratuito oferecido pelos trabalhadores. No entanto, atendendo aos baixos salários de 7$00 diários praticados pelos lavradores, o pagamento estipulado foi o de 8$00 diários e, assim, os trabalhores só perdiam efectivamente 2$00 no trabalho despendido numa semana.
Numa carta dirigida ao Engº Pacheco de Sousa foram descritos ao pormenor os campos e os anexos que se pretendiam para o estádio que se projectava:
a) Foot-ball;
b) Basket-ball;
c) Espaço circular de 45 a 50 etros de diâmetro reservado a touradas à vara larga;
d) Poço a abrir, com bomba eléctrica, depósito em betão armado e respectivas canalizações;
e) Arruamentos arborizados
f) Mata a plantar fora dos espaços destinados aos diversos campos, ao público, carros e respectivos arruamentos, com balouços para crianças;
g) Vedação do campo de jogos em postes de betão armado, com arame liso e arbustos entrelaçados;
h) Campo de ténis;
i) Campo de patinagem adaptável ao Hockey em patins;
j) Stand de tiro aos pombos, podendo ser sobreposto ao campo de patinagem, caso se reconheça a falta de espaço;
k) Uma pequena casa para o guarda e anexo vestiário para os jogadores, urinóis, retretes para homens e senhoras e lavatórios, tendo em volta destas construções uma pequena área de terrenos destinada a ajardinamento;
l) Um pequeno bar, em sítio convenientemente escolhido, de forma a servir os vários campos de jogos;
m) Piscina coberta com cabines para banhos de chuva, a construir junto do local onde for aberto o poço referido na alínea d).
Uma vez implantado este plano de conjunto, seria ainda V.Exª a propor, por fases, a execução de tais trabalhos, escalonando-os racionalmente, talvez em 4 anos, dados os escassos recursos desta Casa do Povo. Só depois deste estudo, poderíamos calcular as possibilidades da sua realização, em comparticipação com o Estado e para atenuara crise de trabalho na região. (Acta nº 30 de 18/12/37)
Como se vê, era sobretudo a preocupação social com os mais desfavorecidos que movia a realização deste projecto, o qual de tão ambicioso, ainda hoje nos parece utópico. Tudo isto era concebido e posto em acção por um homem que, sendo um convicto apoiante do regime então no poder, julgava estar assim a cumprir o programa político desse regime. Nem todos o entenderiam como tal. Outros, para quem as longas paragens de trabalho e as crises que daí resultavam significavam apenas a garantia de poderem praticar os baixos salários que propiciavam o seu fácil e rápido enriquecimento, tudo fizeram para afastar o capitão das suas funções na Casa do Povo.
Seis meses depois de ter sido apresentado o memorando que deveria orientar o projecto, em 1 de Junho de 1938, a direcção reunia-se extraordinariamente para apreciar a sua primeira formulação:
Foi presente uma planta do conjunto do Campo de Jogos da Casa do Povo, da autoria do Arquitecto senhor Mário Silva, de Lisboa, oferecida gratuitamente à Casa do Povo, por intermédio do primeiro vogal senhor António dos Santos Tenreiro. Agradou bastante... embora esta direcção seja da opinião que o campo de foot-ball deveria ter as dimensões de cento e dez por setenta e cinco metros e cabeceiras circulares de forma a permitir uma pista de corridas. Foi ainda resolvido agradecer ao referido arquitecto e aguardar uma nova planta, encomendada pelo senhor Engº Antunes Mendes a um arquitecto da Câmara Municipal de Lisboa, de nome Miguel Jacobetty, a fim da direcção se pronunciar sobre este assunto, de forma que as aludidas obras possam ser executadas em Agosto e Setembro próximo, provável crise de trabalhos rurais nesta vila. (Acta nº 36 de 1/7/38)
Cerca de dois meses depois, o projecto encomendado estava realizado. A direcção reuniu extraordinariamente para apreciar o ante-projecto do Campo de Jogos elaborado pelos arquitectos senhores Miguel Jacobetty Rosa e António Ribeiro Martins: ...foi resolvido, por unanimidade, manifestar aos referidos arquitectos a boa impressão que a todos deixou o aludido estudo. Porém, foi verificado que o Campo de Foot-ball não tem as dimensões mínimas para desafios internacionais (cem metros e cinquenta e oito centímetros por sessenta e quatro metros)... foi mandado aumentar quinze metros ao comprimento e largura do rectângulo marcado na planta (sete e meio para cada lado)... dada a falta de espaço, preferimos sacrificar a pista de corridas, que poucas vezes poderia servir, para termos um campo de foot-ball nas condições referidas. De mais, a pista de corridas pode improvisar-se no próprio campo de foot-ball....
Quanto à elaboração do projecto definitivo do Campo de Jogos desta Casa do Povo, foi resolvido, também, por unanimidade, dados os escassos recursos, que fosse apenas elaborada a primeira fase...que consta do seguinte:
1- Movimento de terras, apenas o indispensável para o nivelamento razoável do recinto;
2- Construção do campo de foot-ball de 105x65m e peão;
3- Abertura do poço circular de 1,80 metros de diâmetro e 14 de profundidade com revestimento em pedra solta e bocal com cantarias, com aros de ferro e roldana;
4- Vedação do terreno em postes de betão armado com arame liso e arbustos;
5- Covas e plantação de árvores.
Solicita-se aos arquitectos urgência no projecto para que os trabalhos arranquem, devido à crise de trabalho, pois estão inscritos nesta Casa do Povo 147 sem trabalho.
Dada a urgência, 50 homens trabalham diariamente no nivelamento do recinto do Campo de Jogos pagando-se a cada um 40$00 por semana de seis dias, ou seja 5 dias a 8$00, revertendo um dia para a Casa do Povo, ou seja, apenas revertem para a Casa do Povo 2$00 porque os salários estão a 7$00 diários... Mas a situação agrava-se à medida que vão terminando os serviços de debulhas dos cereais. (Acta nº 38 de 15/7/38)
Em Agosto número de trabalhadores contratados passou para cem e intensificou-se o recurso ao transporte de terras pelos sócios protectores para que se pudesse incrementar o ritmo dos trabalhos. Em sucessivas cartas, o Capitão César Augusto Correia insistia com o engenheiro responsável pelo projecto para que se apressasse as obras por ser urgente atenuar a crise do trabalho rural. Por outro lado, exigia da parte dos proprietários agrícolas o pagamento das quotas devidas à Casa do Povo como sócios protectores da mesma, e que eram proporcionais ao imposto predial urbano que cada um pagava ao Estado. A prova de que havia muita resistência ao cumprimento desta nas sucessivas reuniões para negociar esses pagamentos é o facto de ter chegado a recorrer aos tribunais para os forçar a pagar esse contributo. Deve ter sido este contencioso que fez com que se acumulassem as razões que ditaram o seu afastamento em Julho de 1941.
Porém, enquanto durou o seu mandato, persistiu sempre na construção do campo de jogos desenvolvendo todas as acções que levassem à consecussão desse objectivo. Em Agosto de 1939 conseguiu que o sócio protector senhor José Mendes, proprietário e lavrador em Elvas, doasse uma valiosa parcela de terreno com a área de 224 m2 entre o campo e a Estrada das Queimadas, para que fosse possível abrir a entrada leste para o campo de jogos. Pelo preço simbólico de 1$00 por metro quadrado adquiriu também a faixa de terreno de 32x55,5m que permitiu o livre acesso da entrada oeste do campo de jogos.
Efectivamente, foi devido ao seu esforço e preserverança, que Campo Maior pòde ver construído o seu campo de futebol. A obra realizada ficou muito aquém do projecto original. Mas, ainda assim, foi a sua construção que tornou possível a prática do futebol em condições mais regulares e que permitiu a emergência dum verdadeiro clube de futebol pois, embora o Sporting Clube Campomaiorense existisse legalmente desde 1926, a verdade é que estivera à beira da toral extinção, por absoluta falta de condições para continuar a sua actividade.
Em finais do ano de 1934, o campo de futebol estava em condições de nele se efectuarem jogos. O jogo inaugural realizou-se num domingo, 3 de Dezembro de 1939 e colocou frente a frente o Sporting Clube Campomaiorense e o Sport Club de Badajoz. Não ficou registado o resultado, se calhar por ser o menos importante. Mas registou-se que o jogo foi muito concorrido e que agradou à população. Foram vendidos bilhetes de 1$00, 1$50, 2$50 e 5$00.
As obras no campo de jogos continuaram. Em Fevereiro de 1941 pedia-se à Direcção Geral dos Serviços Florestais assistência para a plantação de 250 árvores no Campo de Jogos e vedação do referido campo com arbustos numa extensão de 695,5 metros e, bem assim, a sua cedência gratuita a esta Casa do Povo. Em Março resolvia-se pedir para a Mata Nacional das Virtudes as seguintes árvores: 20 plátanos, 20 olaias e 10 amoreiras bravas, sem fruto, para completar a plantação de árvores no campo de jogos....
A inauguração oficial do campo de jogos da Casa do Povo de Campo maior teve lugar a 28 de Setembro de 1941, com benção pelo Senhor Arcebispo de Évora e com a presença do senhor Sub-Secretário de Estado das Corporações com a assistência de vários convidados e muito povo. Esta solenidade verificou-se durante as festas que foram organizadas pela Casa do Povo e que tiveram lugar nos dias 27, 28, 29 e 30 de Setembro. O programa ostentava as seguintes fotografias: Vista do Castelo, Planta da Praça de Campo Maior no Séc. XVIII, Cruzeiro da Independência (inaugurado e benzido no dia 28), Fachada da Casa do Povo, Planta do Estádio Capitão César Correia, Quartel da Legião Portuguesa e Vista Parcial de Campo Maior.
Na Acta da reunião da direcção da Casa do Povo ficou registado que: o povo de Campo Maior ornamentou quase todas as ruas da vila, emprestando às suas festas... a sua melhor cooperação e entusiasmo.
Com a construção do campo da bola a que foi dado o nome do seu promotor – Capitão César Correia – que o construiu para ser utilizado por uma equipa da Casa do Povo, de acordo com as orientações da política corporativa do salazarismo – tornou-se possível para o Campomaiorense aspirar a voos mais ambiciosos, porque o seu presidente de então teve a inteligência e a habilidade diplomática para tornar o novo campo acessível aos treinos e jogos do clube.
Transcreve-se a acta da Casa do Povo de Campo Maior que refere a proposta de atribuição do nome do Capitão César Augusto Correia ao campo de futebol, mandado construir em 1939 por aquela instituição:
“Acta nº19
Acta da sessão extraordinária da direcção da Casa do Povo de Campo Maior com a assistência do Sr. Vice-Presidente da Assembleia Geral.
Aos 22 dias do mês de Novembro do ano de 1939, pelas 21 horas, reuniu-se a direcção da Casa do Povo de Campo Maior, na presença do Sr. Vice-Presidente da Assembleia Geral, professor António dos Santos Tenreiro.
Presente o oficio nº 27, do Sporting Club Campomaiorense com data de 21 do corrente apresentando a sugestão de se dar ao campo de jogos desta Casa do Povo o
nome de Estádio Capitão César Augusto Correia, e que adiante vai transcrito.
Foi gostosa e unanimemente aprovada esta sugestão por toda a direcção, visto que, o Sr. Capitão César Augusto Correia, meritissimo Presidente da Assembleia
Geral desta Casa do Povo, tudo merece pela quanta dedicação e interesse que também lhe merecem todas as questões inerentes a esta Casa do Povo, não se
poupando a todo e qualquer sacrificio em prol da mesma.
Finalmente se transcreve o ofício acima citado, que é do teor seguinte:
Prezados senhores: como é do conhecimento de V.S.as, está já indicado o dia 3 do próximo mês de Dezembro para inauguração do rectangulo de futebol do Estádio da Casa do Povo, 1º passo triunfante da feliz iniciativa que, em tão boa hora, o ilustríssimo Presidente da Assembleia Geral dessa Casa do Povo, Ex.mo senhor Capitão César Correia, se propôs levar a cabo. São por demais conhecidos os resultados dos esforços que, em tempos, várias pessoas e entidades campomaiorenses realizaram para consecução do mesmo objectivo, acabando sempre por desistir ante as primeiras dificuldades. Não obstante as dificuldades serem as mesmas, senão maiores, não obstante a indiferença, os preconceitos, os interesses criados e até o egoismo de alguns, serem obstáculos importantissimos a vencer, nada deteve o espírito de trabalhador incansável, a vontade temperada e persistente do Sr. Capitão César Correia, e, assim, aí temos tornada realidade a velha aspiração (que a muitos parecia um sonho) dos desportistas da nossa terra - possuir um parque desportivo digno desse nome.
Onde muitos campomaiorenses falharam, triunfou rotundamente o espirito moderno e empreendedor do Sr. Capitão César Correia, que com a visão clara da importancia que uma educação fisica sã e ordenada pode ter no aperfeiçoamento da mocidade campomaiorense, desde logo reconheceu a necessidade inadiável de tal realização. Ingratidão seria, pois, que a unica colectividade desportiva desta vila e, consequentemente, os legitimos representantes da população desportista de Campo Maior, não manifestasse o seu reconhecimento pela admirável obra com que o Sr. Capitão César Correia dotou Campo Maior. Deste modo, ao mesmo tempo que apresentamos a todos os directores da Casa do Povo os nossos melhores agradecimentos pela colaboração prestada ao mui ilustre Presidente da Assembleia Geral, pedimos que nos permitam lembrar que ao Campo de Jogos seja dado o nome de "Estádio Capitão César Correia", pois só assim poderemos testemulhar-lhe o agradecimento a que tem jús por parte de todos os campomaiorenses. Não pretendemos com este alvitre lisonjear ou elogiar o Capitão César Correia. Não. O seu melhor elogio está na sua obra. Queremos, sim, que aos frutos da sua persistencia e da sua vontade inabalável, numa palavra. que à sua obra seja dado o seu nome. Estamos certos que tambem V.Exas assim pensam e que, por isso, terão na devida conta este alvitre, que é, afinal, o desejo de todos os campomaiorenses. Esperando que V.S.as nos relevem esta interferência nos assuntos da Casa do Povo, aproveitamos a oportunidade para apresentar a V.S.as as nossas mais cordiais saudações. Pela Direcção do Sporting Club Campomaiorense, Luiz Marchã, Director-Secretário”.
Nada mais havendo a tratar foi encerrada a sessão de que se lavrou a presente acta que vai ser assinada por todos os presentes e por mim Alberto Semedo Batuca, secretário que a subescrevi e assino:
António dos Santos Tenreiro, prof.
João Gonçalves de Carvalho
Augusto Semedo Batuca
António Marchã
(mais duas assinaturas ilegíveis)
A hábil atitude da direcção do Sporting Club Campomaiorense, deve ter facilitado as negociações para a cedência do estádio para as actividades desportivas do clube. Assim, logo após a inauguração do estádio, foram promovidas as negociações para que tal se tornasse possível, como ficou testemunhado nos documentos lavrados na época:
Acta Nº 13 da sessão ordinária da Direcção da Casa do Povo de Campo Maior (...) aos sete dias do mês de Setembro de mil novecentos e quarenta, pelas vinte e duas horas (....)
Presente o ofício Nº 9 do Sporting Club Campomaiorense de 5 dop corrente, foi resolvido convidar a Direcção do mesmo Club, a fim de esclarecer e completar as propostas de contrato a efectuar para a presente época de 1940/41, a qual se fez representar pelos senhores Francisco Marchã e João Lavadinho Velêz.
Foi acordado entre esta Casa do Povo e os referidos representantes o seguinte:
1º - O Sporting Club Campomaiorense pagará à Casa do Povo, para ter direito à utilização do Campo de Jogos, para treinos, a quantia de 20$00 mensais, excepto nos meses de Julho e Agosto, pagamento que será feito nos cinco primeiros dias de cada mês. (...) Os treinos referidos terão lugar nas terças e quintas-feiras; e, aos domingos, quando não haja desafio ou o campo não seja cedido para quaisquer outros jogos.
2º - A Casa do Povo compromete-se a pagar ao Sporting na actual época de 1940/41, a quantia de 150$00 por cada jogo particular que se realizar no seu Campo, depois de prévio acôrdo com a Direcção da Casa do Povo, ficando todas as outras despezas a cargo do referido Club, tais como deslocações de jogadores que venham reforçar o seu “team”, desastres sucedidos a jogadores durante desafios ou treinos ( assistência médica, medicamentos e salário ), conserto de botas e lavagem de equipas, alcool, algodão e trança, enfim, todas as despesas resultantes dos desafios.
3º - Nos jogos de Campeonato – jogos oficiais – A Casa do Povo receberá toda a receita dos desafios efectuados no seu Campo, pagando apenas a deslocação de qualquer jogador que venha reforçar o “team” do Sporting, desde que esta despeza não seja superior a 50$00, limite máximo que fica estabelecido para cada desafio.
4º - Nos jogos oficiais que o Sporting tenha de efectuar fora de Campo Maior, a Casa do Povo pagará a importância do transporte em camionete, a deslocação de qualquer elemento que venha reforçar o “team” daquele Club, desde que esta despeza não seja superior a 50$00, limite máximo que fica estabelecido para cada desafio e, bem assim, um lanche para os jogadores, quando o desafio se realize em localidade que esteja a mais de 30 quilometros da vila de Campo Maior, desde que o custo desse lanche não vá além de cinco escudos por cada jogador, limite máximo que fica estabelecido para cada desafio nas condições referidas. (...)
Este contrato parecia não ser muito favorável ao Sporting Club Campomaiorense, pois que as suas disposições retiravam grande parte da autonomia do clube tornando-o praticamente dependente da Casa do Povo, pelo menos no que respeitava à prática do futebol.
Talvez por isso, e também porque tinha sido criado o Grupo Desportivo da Casa do Povo, no ano seguinte foi firmado um novo acordo, mais favorável quer do ponto de vista económico, quer no que respeita à capacidade do clube gerir os seus assuntos internos.
Acta da sessão extraordinária da direcção da Casa do Povo de Campo Maior(...) Aos dezoito dias do mês de Abril do ano de mil novecentos e quarenta e um, (...)
As disposições regulamentares para o uso do “Estádio Capitão César Correia”, as quais começam a vigorar a partir de 1 do proximo mes de Maio e são do teor seguinte:
1ª - O Estádio poderá ser utilizado, para efeito de treinos, pelo Grupo Desportivo da Casa do Povo e pelo Sporting Club Campomaiorense nos dias que a sorte designar – Grupo Desportivo da casa do Povo, 2ª, 4ª e 6ª -feiras – Sporting Club Campomaiorense – 3ª, 5ª e sábados.
2ª - O Sporting Club Campomaiorense pagará mensal e adiantadamente, para ter direito à utilização dos campos, para treinos, a quantia de 30$00; porém, se não tiver satisfeito este pagamento até ao dia em que se efectuar o seu primeiro desafio mensal, será a importância em dívida descontada na receita proveniente das entradas no estádio;
3ª - Só terão ingresso nos campos, nos dias de treinos, os individuos por quem se responsabilise um socio do Grupo Desportivo da Casa do Povo ou do Sporting Club Campomaiorense, conforme o caso, (...)
4ª Os domingos e dias feriados são destinados a desafios ou qualquer outro espectáculo compatível com o fim a que o estádio se destina;
5ª - Os espectáculos dos domingos e dias feriados serão organizados pelo grupo Desportivo da Casa do Povo e Sporting Club Campomaiorense alternadamente sempre que seja possível;
6ª - (...) o Grupo e o Club organizarão um calendário desportivo e farão os seus pedidos com, pelo menos 15 dias de antecedência;
7º - Nos domingos o estádio fica à disposição dos grupos desportivos organizadores dos desafios de futebol, basquetebol e andebol desde as 14 horas; e, nos dias de treinos, desde as 12 horas (...)
8ª - A Casa do Povo de Campo Maior compromete-se a apresentar, nos dias em que se realizem desafios ou qualquer outro espectáculo com entradas pagas, os campos devidamente marcados e as balizas com as redes necessárias à boa regularidade dos jogos;
9ª - Em dias de desafio ou qualquer outro espectáculo pago, o Sporting Club Campomaiorense pagará á Casa do Povo 15% da receita bruta;
10ª - A Casa do Povo fornecerá os bilhetes aos seus empregados ( que ) são os únicos responsáveis pela sua venda ao público (...);
11ª - A fiscalização das entradas (...) pertencerá aos delegados do Sporting Club Campomaiorense e aos empregados da Casa do Povo previamente indicados;
12ª - A Casa do Povo fornecerá bilhete especial de entrada livre aos correspondentes dos jornais diários nesta localidade(...);
13ª - O Sporting Club Campomaiorense poderá fornecer bilhetes de entrada livre (...) em número não superior a 5 (...);
14ª - Só terão validade os bilhetes de entrada livre que tenham o selo branco da Casa do Povo (...)
Esta nova formulação não tem já o carácter leonino que, na primeira versão, tornava o clube quase que uma secção desportiva dependente da Casa do Povo. Mais uma vez, a direcção do Sporting Club Campomaiorense, presidida por Francisco Marchã, conseguia muito diplomaticamente negociar de modo a obter vantagens para o clube em condições de negociação que, naqueles tempos, nem sempre eram fáceis de conduzir a bom porto, sobretudo por quem não fosse clara e inequivocamente pessoa das boas graças do regime político instituído. Segundo testemunhos de contemporâneos, o presidente do clube não era um apoiante ou figura grata do regime; antes seria visto por este com grandes reservas e desconfiança. Essa circunstância ainda torna mais digna de louvor a sua perseverante acção em prol do clube. Francisco Marchã, deve a justo título ser considerado um verdadeiro refundador do Sporting Club Campomaiorense, porque não só conseguiu tirá-lo da situação de quase total inércia em que tinha caído ao longo dos anos trinta, como conseguiu dotá-lo das condições e da dinâmica que o vão tornar nos anos 40 um autêntico clube de futebol. Pela sua acção denodada, pela sua dedicação esforçada e pela inteligência que colocava nos projectos em que se envolvia, Francisco Marchã salvou o Sporting Club Campomaiorense do desaparecimento total, como aconteceu com todos os outros clubes que existiram em Campo Maior, também eles fundados na década de vinte. Não são conhecidos documentos escritos que indiquem com clareza as datas entre as quais terá presidido à direcção do clube. Os dados disponíveis apontam para o período que ocupa os anos finais da década de trinta e os primeiros anos da década de quarenta. De qualquer modo os indícios da sua acção apontam para que se possa considerar sem receio de errar que Francisco Marchã é uma das mais ilustres figuras da história do Sporting Club Campomaiorense.
Com a saída do capitão César Correia da Casa do Povo de Campo Maior, esta entrou num período de vida muito apagado, deixando de aparecer qualquer referência a novos projectos ou iniciativas dignas de registo.
Em 1944 é Vice-presidente da Assembleia Geral o senhor Luís da Gama Pinheiro, homem ligado ao Sporting Clube Campomaiorense e que por mais de uma vez integrou os seus corpos sociais. Numa reunião por si dirigida, em 19 de Outubro de 1944, a Direcção da Casa do Povo decide oficiar o Sporting Clube Campomaiorense de que o aluguer do campo será de 120$00 por cada jogo, e no mês seguinte toma a decisão de se tornar sócio auxiliar so Sporting Clube Campomaiorense com a quota de 120$00.
Na acta da reunião de Direcção de 21 de Dezembro de 1946, regista-se que a construção de um balneário de madeira no campo de jogos em 1945, feita pelo Sporting Clube Campomaiorense e que cujo custo total foi de 5.389$00 venha a ser amortizado com o pagamento dos 120$00 do aluguer do campo por cada jogo.
Numa acta de 5 de Novembro de 1948 regista-se um novo contrato entre as duas entidades para a utilização do estádio, desistindo a Casa do Povo da sua utilização por não desenvolver qualquer actividade desportiva. O Sporting Clube Campomaiorense ficava o seu utilizador único, como arrendatário das instalações.
O senhor Presidente da Direcção apresentou a seguinte proposta:
Considerando que a Casa do Povo de Campo Maior, proprietária do campo de jogos denominado "Capitão César Coreia", não tem possibilidade de melhorar o campo referido e que entre os seus associados, quase todos trabalhadores rurais, não há possibilidade de construir um team de foot-ball que tenha condições para promover desafios e despertar o interesse pelo desporto por forma a permitir a valorização e melhoramento do campo; considerando que este grupo grupo desportivo tem interesse em tomar de arrendamento o campo referido, proponho que se arrende ao grupo desportivo Sporting Clube Campomaiorense, e pela renda anual de 1.200$00, nas condições que abaixo se discriminam:
1- A Casa do Povo não ficará responsável nem responderá nunca por qualquer violação deste contrato ou sua interrupção quando isso se der por facto emergente da posição que em relação campo mantém o Ministério da Guerra, ou por intervenção do Estado ou das autoridades locais;
2- Todas as benfeitorias úteis realizadas no campo com fundos do clube serão levadas em conta e descontadas nas rendas até ao limite destas e reembolsadas ao Sporting Clube Campomaiorense pela Casa do Povo quando esta entidade, e só nesta hipótese, se recusar no fim do actual arrendamento e fazer novo contrato, nos termos do actual e por igual período de tempo;
3- Dos subsídios que forem concedidos a pedido das duas contratantes, entender-se-á que cabe a cada uma das partes intervenientes metade da verba concedida;
4- Se o subsídio for concedido a pedido, ou a favor, de uma das partes contratantes, entender-se-á que só a essa parte diz respeito;
5- Em face deste critério, fica entendido que a parte respeitante ao arrendamento será considerada, para efeito de aplicação em benfeitorias úteis, como fundos do próprio club e a parte respeitante à Casa do Povo como fundos deste organismo;
6- Para cumprimento e boa execução destas cláusulas, o Sporting Clube Campomaiorense dará conhecimento à Casa do Povo das obras a realizar e realizadas a fim de a última destas entidades poder verificar a sua execução;
7- Se a Casa do Povo quiser levar a efeito qualquer festa, aproveitando para isso o seu campo de jogos, poderá fazê-lo, desde que isso não altere a realização de qualquer desafio previamente combinado;
8- Os corpos gerentes da Casa do Povo terão sempre a faculdade de visitar o campo, incluindo nos próprios dias em que se efectuarem desafios, para o que lhe serão reservados lugares da melhor categoria;
9- A rescisão deste contrato por culpa ou negligência do Sporting Clube Campomaiorense, priva este club de qualquer indemnização a que tenha direito;
10- O Sporting Clube Campomaiorense obriga-se a manter o campo de jogos em estado de arranjo e limpeza compatíveis com o fim a que se destina, não esquecendo nunca o alto objectivo do desenvolvimento do desporto que inspirou este contrato;
11- Os móveis e objectos inerentes ao aproveitamento do campo que pertencerem á Casa do Povo, serão descritos neste contrato e confiados à guarda e conservação do Sporting Clube Campomaiorense.
Como se pode deduzir das cláusulas deste contrato, o Sporting Clube Campomaiorense passava a gerir em quase total liberdade os espaços desportivos e as instalações do Estádio Capitão César Correia, ou seja, passava a dispor completamente do espaço necessário ao desenvolvimento da sua actividade.
Assim, na década de 40, com a possibilidade de utilizar um verdadeiro campo de futebol, o Sporting Clube Campomaiorense pôde finalmente começar a participar nos campeonatos organizados pela Associação de Futebol de Portalegre, na qual se tinha podido finalmente inscrever, passando a disputar os campeonatos distritais desta associação. A construção do Estádio Capitão César Correia criaria as condições propiciadoras de uma notável mudança. Notícia de A Rabeca de 28 de Abril de 1940: para passagem de divisão no nosso distrito, o Sporting Club Campomaiorense deslocou-se a Portalegre, defrontando o Sport Lisboa e Portalegre verificando-se um empate a uma bola.
Em 19 de Maio; Sporting Club Campomaiorense vence o Sport Lisboa e Portalegre por 10-0 e em 13 de Outubro, vence o Alentejo por 14-1. Estes resultados permitem-lhe disputar com o Estrela , o Alentejo e o Desportivo o Campeonato Distrital de Portalegre na época de 1940-1941. Começava um novo ciclo na vida do clube.
Conquistou o titulo de Campeão Distrital na categorial de Reservas nas épocas de 1940, 1941 e 1942 e o titulo de Campeão de Juniores na época de 1944/45. Conseguiu em pouco tempo o êxito retumbante de ascender à II Divisão que disputou desde a época de1945/46 até à de 1950/51, época em que desceu à III Divisão Nacional que se tinha começado a disputar desde a época de 1947/48. Disputou a III Divisão durante a década de 50.
Vivendo essencialmente do amadorismo, recrutava os seus desportistas na juventude local.
Capitão César Correia, o grande impulsionador da construção do estádio que acabou por envergar o seu nome
Estádio Capitão César Correia
uma obra de Joaquim Folgado e Francisco Galego