domingo, 20 de setembro de 2009

4- Recomeçar de novo

Só anos mais tarde, desvanecidos os efeitos provocados pela Guerra, o futebol voltaria ao interesse dos habitantes de Campo Maior. Regressou de forma tímida e muito titubeante. Tinha-se perdido o hábito e o jeito. Era necessário voltar a partir do ponto zero. Corriam já os anos vinte quando voltaram a aparecer notícias que documentam o renovar do interesse pelo jogo da bola.

Uma notícia do Campomaiorense em 10 / 3 / 22, referia que o Sport Atlectic Club de Elvas solicitou (um treino ) aos antigos jogadores dos extintos grupos desta vila, como preparação para um desafio em Badajoz...

O treino acabou quinze minutos depois de ter começado, porque se avariou a bola e não havia outra para a substituir. Podemos da notícia inferir que, à data, não existia em Campo Maior sequer uma simples bola de couro, quanto mais grupos de futebol organizados.

Em 10 de Novembro de 1922, o mesmo jornal noticiou a tentativa de constituição do Operário Foot-Ball Club mas o projecto não passou de uma festa para angariar fundos que não teve qualquer sucesso.

Em 15 de Outubro de 1924, noticiava-se a criação de novo clube, Campo Maior Sport Club,um team de sport na nossa terra, e este, com secções de tennis, de tiro e de foot-ball os três sportes mais cultivados em Portugal... A comissão técnica de foot-ball ( era constituída por ) José Mata, Aspirante Rodrigo Botelho e Joaquim Mata.”

Em 15 de Novembro de 1924, o mesmo jornal noticiava a criação dos novos clubes de futebol, os quais pretendiam constituir-se em Federação Sportiva de Campo Maior: Campo Maior Sport Club (ainda tinha sede em 1933) ; Operário Futebol Club e Esperança Futebol Club. O projecto não deve ter passado das boas intenções, porque não há noticias de que a iniciativa tenha surtido efeito.

Estes clubes eram constituídos mais com o objectivo de funcionarem como associações de carácter recreativo, propiciando a organização de festas e a prática desportiva, do que para organizarem verdadeiras equipas de futebol bem estruturadas, com carácter permanente e vocacionadas para a disputa de campeonatos. Aliás, nesta época os campeonatos eram de carácter regional. O Campeonato de Portugal começara apenas na época de 1921-22 e era disputado entre o campeão de Lisboa e o campeão do Porto. É verdade que a Associação de Futebol de Portalegre já existia desde 1911. Aliás, foi a segunda a constituir-se, logo a seguir à de Lisboa que começou um ano antes, em 1910 e um ano antes da Associação de Futebol do Porto que se constituiu em 1912. Aliás estas associações tinham um carácter mais local do que regional. A Associação de Foot-Ball de Portalegre até à década de 30, limitava-se a organizar os campeonatos que envolviam apenas as equipas da cidade que estavam inscritas na associação: Grupo Desportivo de Portalegre, Sport Club Estrela, Sport Lisboa e Portalegre, Alentejo Futebol Club. Mas havia outros clubes na cidade que não estavam inscritos na associação e que não disputavam o campeonato: Electro Club, Onze Vermelho e Sporting Club Portalegrense.

O Jornal de Elvas de 12 Outubro de 1930 titulava: Associação de Foot-Ball de Elvas. Quando se resolve o magno problema da sua fundação?

Todos conhecem as vantagens de tal medida e será desnecessário apontá-las. Basta lembrar-lhes que delas adviria um campeonato com bases e regularidade e, como consequência, os “matchs” inter-cidades e inter-regiões, seriam como que um complemento ao desideratum em vista.

Só em 7 de Janeiro de 1933 essa aspiração seria concretizada na criação da Liga de Foot-Ball e Desportos Atléticos de Elvas, também ela confinada aos clubes da própria cidade. Desde logo, em Março, esta organização levou a efeito o Torneio da Liga em 1ª e 2ª categorias. A partir de então foi possível apurar o clube representante da cidade no campeonato distrital a disputar com o vencedor da Associação de Portalegre.

Numa época em que os transportes eram escassos, lentos e pouco confortáveis, tornava-se difícil fazer deslocar grupos numerosos como as equipas de futebol.

Acresce que outro factor fundamental impedia a disputa de jogos oficiais de futebol: a inexistência de um campo com medidas regulamentares e com condições minimamente aceitáveis. Esta terá sido a principal razão a impedir o aparecimento de verdadeiros grupos de futebol mais cedo em Campo Maior.

Em 1925, para responder à solicitação de um desafio feita pelos elvenses, teve de se fazer à pressa uma equipa com os jogadores que se mostraram disponíveis e, dizia a notícia do jornal, que os de Campo Maior revelaram maior dificuldade por falta de treino.

Verdadeiros clubes de futebol, privilegiando a sua prática e praticando-o com certa regularidade, só surgem em Campo Maior em 1926 com o Vitória Foot-Ball Club que, embora criado dois anos antes, não apresenta qualquer actividade significativa até então, e com Sporting Club Campomaiorense fundado por dissidentes do Vitória Foot-Ball Club.

João Ruivo, agora já afastado da prática do futebol, redigiu os estatutos do Sporting Club Campomaiorense. O seu interesse pelo futebol mantinha-se. Continuava atento ao que se passava com este desporto, procurando manter-se actualizado até com os seus aspectos técnicos e tácticos. Da sua biblioteca fazia parte um manual intitulado Football ( técnica e didáctica do jogo ), escrito por Augusto Sabbo , antigo jogador do Mittweidaer Ballspiel Club da Saxónia, do CIF (Club Internacional de Futebol ), de Lisboa e do grupo representativo da Liga Portuguesa de Football. Esta obra editada em Lisboa em 1923 é um minucioso manual de 75 páginas sobre todos os aspectos importantes do futebol.

Não será de todo estranho a esta informação e a este interesse de João Ruivo sobre a prática futebolística, a sua escolha para o Conselho Técnico do Sporting Club Campomaiorense em 1927.

Desde o início, os dois clubes polarizaram uma rivalidade terrível, dividindo a população que apreciava o chuto na bola nos dois grupos de adeptos que apoiavam um e outro dos clubes. Esse proselitismo a nível local acabava por se projectar também na divisão das simpatias entre os dois clubes de que eram filiais, que disputavam o campeonato de Lisboa e que já tinham grande projecção a nível nacional. Essa rivalidade local só se extinguiu quando o Vitória Foot-Ball Club acabou por desaparecer.

Não admira que tendo sido João Ruivo um dos mais entusiastas do antigo 5 de Outubro Foot- Ball Club, desaparecido havia uma década, seja o jornal de que era redactor principal, o Notícias de Campo Maior, a dedicar atenção ao que se passava no futebol.

Em 24/6/26, noticiava-se no Notícias de Campo Maior a recepção de uma carta do Vitória Foot-Ball Club a dar conta da sua existência e que o clube tinha requerido ao Ministério da Guerra a cedência de uns terrenos ao Forte das Pesetas, na Estrada das Queimadas, para ali ser instalado o seu campo de jogos...Enquanto o caso não fôr resolvido, a direcção do club requereu autorização à Câmara Municipal para se fazerem os treinos provisoriamente num largo à Avenida Dr. Agrela...

A 5/8/26 noticiava-se que o Vitória local nomeara o seu delegado junto do Vitória Foot-Ball Club de Setúbal de que era filial.

Só em 25/8/26, era noticiada a fundação ( 1/7/26 ) do Sporting Club Campomaiorense e, simultaneamente, em Elvas, o Club Foot-Ball os Elevenses.

Em 25/9/26, o Notícias de Campo Maior dedicava uma página inteira à visita que o Grupo Desportivo de Portalegre fez à vila para participar numa interessante festa promovida pelo Vitória Foot-Ball Club comemorativa do 2º aniversário da sua fundação. Nesse ano eram membros dos seus corpos gerentes A. Miranda, Pedro Vitorino, Joaquim Mata, Raul Soeiro, Carlos Lavadinho, João Candeias, Cabecinha e António Borrega. A equipa que defrontou o grupo de Portalegre, foi derrotada por 3-0 e era constituída pelos seguintes jogadores: Miranda (guarda-redes); Soeiro e Ribeiro (defesas); Valadas, Cabecinha e Alegria (médios defensivos); M. Centeno, D. Ruivo e Vilas (médios ofensivos); J. Centeno e o capitão Tomatas (avançados).

Em Degolados que fora anexada ao concelho de Campo Maior em 6/12/26, já existia em 17/6/28 o União Sport Club Degoladense.

Os factos testemunhados pelo Notícias de Campo Maior, provam que muitas das convicções que se enraízaram sobre as origens do Campomaiorense, não têm qualquer fundamento.

O Sporting Clube Campomaiorense nasceu efectivamente em 1 de Julho de 1926. No primeiro ano de existência teve muito pouca ou mesmo nenhuma actividade desportiva. Pelo menos não há qualquer indício de que tenha existido qualquer actividade.

Neste primeiro ano da sua existência, os corpos gerentes ficaram assim constituídos:

Assembleia Geral :

Secretários:

António da Encarnação Ruivo

António Veríssimo Ruivo

Direcção Administrativa:

Domingos António Rabiais, presidente

Manuel Lavadinho Mourato, secretário

João Conde Gonçalves, tesoureiro

Conselho Fiscal

Presidente – Agnelo Ferreira Topa

Secretário – Manuel Martins Ruas

Relator - Domingos Saraiva Cunha

Na assembleia em que foram eleitos os primeiros corpos sociais, além da eleição, foi resolvido aprovar os estatutos e enviar um exemplar ao Sr. Governador Civil e outro ao Administrador do Concelho.

O ano de 1926, ano da fundação, terá sido totalmente dedicado às tarefas de organização do clube. Esse primeiro ano terá sido dedicado à angariação dos sócios e dos fundos necessários, à constituição das equipas, à realização de treinos e à confecção dos equipamentos.

O clube nasceu, pelo nome, pelas cores e pelos símbolos, ligado à imagem do Sporting Clube de Portugal, mas não há referência explícita de que se tenha de imediato constituído como filial do clube de Lisboa. Contudo, tudo leva a crer que foi quase coincidente com a sua fundação, a sua constituição como 27ª filial do Sporting Clube de Portugal.

No Notícias de Campo Maior de 11 de Setembro de 1927, vem noticiada a eleição dos primeiros corpos gerentes do Sporting Clube Campomaiorense que ficaram assim constituídos:

ASSEMBLEIA GERAL

Presidente : ANTÓNIO LAVADINHO MOURATO

Vice-presidente : ANTÓNIO AFONSO BORREGO

1º Secretário : JOÃO TIAGO LAVADINHO

2º Secretário : JOSÉ FERNANDES MOREIRA

DIRECÇÃO ADMINISTRATIVA

Presidente : DOMINGOS ANTÓNIO RABIAIS

Vice-presidente : ESTEVÃO CALDEIRÃO

1º Secretário : MANUEL LAVADINHO MOURATO

2º Secretário : ADELINO DOS SANTOS MARCHÃ

Tesoureiro : JOÃO CONDE GONÇALVES

Vogal : DAVID FONSECA RIBEIRO CARAÇAS

Vogal : ANTÓNIO LAVADINHO LEITÃO

CONSELHO TÉCNICO

Presidente : JOÃO PEDRO RUIVO

Secretário Relator : JOÃO C. SARAGOÇA

Vogal : MARCIANO DAVID ALVES

Vogal : MANUEL PEREIRA SEVERO

Vogal : MANUEL DIAS FERREIRA

Penso que será nestes e não noutros nomes que devemos considerar que assenta a honra de terem sido os fundadores do Sporting Clube Campomaiorense.

Para além das notícias nos jornais da época, existem as duas mais antigas fotografias do Sporting Clube Campomaiorense, tiradas no ano de 1927 frente ao muro do Forte do Príncipe que confina a Ocidente o Jardim das Viúvas e que foi tirada para inaugurar os primeiros equipamentos de que o clube dispos.

Nelas os jogadores estão equipados de camisas metade verdes, metade brancas e calção preto, ou seja, com o equipamento designado à stromp¸ que ainda hoje é utilizado pelo Sporting Clube de Portugal.

Numa delas figuram os elementos da equipa senior, com a presença do Vice-Presidente da Comissão Administrativa, Sr. Estevão Caldeirão que é o proprietário das fotografias.

Na outra, a equipa dita dos infantis e que, a avaliar pelas idades dos jogadores, corresponderiam ao que hoje chamamos juniores, figura o Presidente da Comissão Administrativa, Sr.Domingos António Rabiais que deve, a justo título, ser considerado o primeiro presidente do Campomaiorense. Note-se que figura como guarda-redes da equipa de seniores na outra fotografia.

Há ainda uma terceira fotografia publicada no mesmo ano pelo Notícias de Campo Maior, que confirma a autenticidade das primeiras pois mostra a equipa com os mesmo jogadores, com apenas pequenas diferenças.

O Sporting Clube Campomaiorense celebra as suas bodas de diamante, pois fará 75 anos de existência a 1 de Julho de 2001. É uma óptima altura para comemorar e para se repor alguma verdade acerca das origens do clube que esteja documentada em testemunhos directos e confirmados.

Esses testemunhos permitem conhecer os nomes e até os rostos dos que, quer como dirigentes, quer como jogadores, lançaram as bases do clube.

Que melhor homenagem haverá do que a de reconhecer pública e oficialmente o precioso contributo dado por estes fundadores?

AUGUSTO SABBO – FOOTBALL

( Técnica e Didáctica de Jogo )

Empresa Literária Fluminense, Lª, Lisboa, 1923, 75 páginas

(Livro da biblioteca particular de João Ruivo)

PREFÁCIOS

TÉCNICA E DIDÁCTICA DO FOOTBALL ASSOCIATION

I – Iniciação

II – Elemento necessário ao jogo e qualidades primordiais

necessárias a êsse elemento

III – A técnica do football

IV – O treinador ou instrutor

V – Treinos progressivos – Treinos intensivos – Treinos de ensaio

VI – Introdução às teorias

VII – Teoria da triangulação

VIII – Principios gerais de aplicação prática

IX – Passe iniciais do jôgo quando se emprega a teoria da

triangulação

X – Teoria do off-side

XI – Principios gerais de aplicação prática

XII – Teoria dos movimentos relativos

XIII– Principios gerais de aplicação prática

XIV – Passes iniciais do jôgo quando se aplica a teoria dos

movimentos relativos

XV - Conclusão











uma obra de Joaquim Folgado e Francisco Galego