domingo, 10 de maio de 2009

Lutz Pfannenstiel: do pesadelo na Albânia ao sonho na Antárctica

Lutz Pfannenstiel é o recordista de transferências no futebol mundial. Em dezoito anos de carreira, o guarda-redes nascido na Alemanha experimentou 22 clubes, nos cinco continentes. Aliás, seis continentes, porque para a FIFA a América divide-se em dois. Chamar-lhe alemão não parece correcto. Lutz assume-se como um cidadão do mundo.

«É claro que eu fui tomando as decisões, mas foi a vida que decidiu assim. Nunca mudei de clube a pensar em dinheiro, nunca pus de parte nenhum tipo de futebol e passei por vários países com diferentes qualidades de jogo. Troquei de clube por causa dos treinadores, de lesões, porque não jogava, ou simplesmente porque achei que estava na hora de um novo desafio», confessa-se Lutz.

O guarda-redes fez escola no Bayern de Munique e chegou a internacional sub-17 pela Alemanha, mas não conseguiu ir mais longe. No futebol do seu país, claro está. Porque quilómetros são coisa que não faltam na bagagem de Lutz: desde a Malásia, à Albânia, da Nova Zelândia ao Brasil, do Canadá à África do Sul, este globetrotter experimentou de tudo. Ou quase tudo. «Não sou pessoa de lamentos, mas tenho pena de nunca ter jogado na Bundesliga», diz Lutz.

Actualmente com quase 36 anos, o guarda-redes esteve perto de acrescentar Portugal à lista de países por onde passou. «Só por acaso tal não aconteceu. Estive aí há alguns anos, mas depois as coisas não se proporcionaram. Não cheguei a acordo com o Marítimo. Fui lá por causa do Mitchell [van der Gaag], que é muito meu amigo, mas depois não resultou», contou o viajado atleta.

«Uma pena» é como Lutz define a oportunidade fugida. «O futebol português é muito interessante. Gostaria de ter concretizado essa hipótese», reconheceu. Mas tendo em conta as perspectivas futuras do jogador, até pode ser que isso ainda suceda.

«Ainda tenho objectivos, apesar do tempo limitado para jogar. Por exemplo, gostava de conseguir agora a promoção com o Manglerud. Gostava de voltar a passar por África e jogar na Rússia. Adoro o futebol da América do Sul também e gostava de regressar. O meu último objectivo é chegar aos 40 a jogar», explicou Lutz.

Aqui tem o histórico da carreira de Lutz. 
1991-93, FC Bad Kotzting (Alemanha) 
1993-94, Penang FA (Malásia) 
1994, Wimbledon (Inglaterra) 
1995, Nottingham Forest (Inglaterra) 
1995, Sint-Truidense (Bélgica) 
1995, Hamrun Spartans (Malta) 
1996, Sembawang Rangers (Singapura) 
1996, Orlando Pirates (África do Sul) 
1996-97, Nottingham Forest (Inglaterra) 
1997, TPV (Finlândia) 
1997-98, Nottingham Forest (Inglaterra) 
1998-99, SV Wacker Burghausen (Alemanha) 
1999-2000, Geyland United (Singapura) 
2001, Dunedin Technical (Nova Zelândia) 
2001, Bradford (Inglaterra) 
2001, ASV Cham (Austria) 
2002, Dunedine Technical (Nova Zelândia) 
2002-03, Bradford (Inglaterra) 
2003, Dunedine Technical (Nova Zelândia) 
2004, Calgary Mustangs (Canadá) 
2004-06, Otago United (Nova Zelândia) 
2006-07, FK Vllaznia (Albânia) 
2007, Baerum (Noruega) 
2007, Vancouver Whitecaps (Canadá) 
2008, Hermann Aichinger (Brasil) 
2008-09, Floy (Noruega) 
2009, Manglerud Star (Noruega) 



Para quem vive no futebol e, especialmente, do futebol, há sempre aspectos mais ou menos cativantes no mundo da bola. Lutz Pfannenstiel guarda mil e uma experiências de cada um dos seus 22 clubes. Umas boas, outras nem por isso.

«A situação mais estranha que vivi aconteceu na Albânia. Fora do futebol tudo bem, as pessoas eram normais. Mas dentro do mundo futebolístico era terrível, atacavam-nos, atiravam-nos com tudo, pedras, isqueiros, garrafas¿ Até o presidente chegou a bater nos jogadores. Uma coisa surreal. É muito difícil de esquecer, foi quase uma tortura, tempos horríveis. É talvez o pior sítio do mundo para se jogar futebol. Levei algum tempo a recuperar mentalmente dessa aventura», contou o guarda-redes.

As boas recordações, por outro lado, são bastante especiais para este globetrotter. 
«Os meus melhores momentos? Um jogo que disputei na América em 2007, contra os LA Galaxy de Beckham. O estádio estava cheio, fumegava, foi uma sensação gira. Mas está claro que estavam lá todos só para ver o Beckham», lamentou, entre risos.

Um outro grande momento para Lutz foi a estreia no Brasil. Era o acumular de mais um país, mas com significado especial. «O futebol no Brasil é único», começou por dizer Lutz. «Além do mais, significava o quinto continente na minha carreira, um marco que ainda ninguém igualou. O meu primeiro jogo lá foi fantástico, fui muito bem recebido e a estreia oficial correu lindamente», recorda o jogador de 35 anos.

Apesar de todo o carinho que se percebe cada vez que Lutz fala do futebol sul-americano, o guarda-redes também viveu uma ou outra peripécia em terras canarinhas. «Lá também me aconteceram situações engraçadas. Uma vez cortaram a luz a meio de um jogo e tivemos que esperar não sei quanto tempo para poder concluir a partida.» Nada de grave, nada que faça Lutz querer apagar a memória desses tempos.

Para o cidadão alemão Lutz Pfannenstiel, o mundo cabe numa bola. Mas o que ele gosta mesmo é do ambiente que rodeia uma partida de futebol. «A atmosfera é o meu elemento preferido. Já joguei perante muitos milhares de pessoas e só com centenas a assistir, mas todos os jogos têm o seu encanto. Estar com o estádio cheio é muito estimulante. E adoro os cânticos!», confessa entusiasmado.


Lutz não é só um jogador invulgar pela forma como geriu a sua carreira até ao momento. O guarda-redes alemão aplica-se bastante também fora dos relvados. O melhor exemplo da sua atitude humanitária chama-se Global United FC. É um clube de futebol, o que não estranha, mas toma umas quantas medidas no mínimo¿ inéditas. As preocupações ambientais levam o Global United a jogar nos locais mais afectados pelo problema do aquecimento global. Ninguém melhor que o mentor para dar a conhecer a ideia.

«O Global United é o meu maior projecto de vida. Sempre fui uma pessoa que gosta de ajudar, que se preocupa. Decidi criar algo que me permita fazer alguma coisa pelo mundo. Primeiro pensei num projecto de direitos humanos, mas depois achei giro ligar o ambiente e o futebol. Abri um clube ecológico, adepto da natureza, preocupado com o aquecimento global, um grave problema dos tempos que correm», lembra o guarda-redes.


Lutz explicou quais os próximos passos do Global United e diz «acreditar fortemente» no cumprimento dos objectivos a que se propôs.

«Achei por bem utilizar a força do futebol para chamar a atenção para o problema do aquecimento global. A beleza do projecto está na forma de captar ajuda através do interesse que o futebol estimula. Os próximos projectos envolvem Barack Obama e Angela Merkel. Vamos realizar um jogo de estrelas em Copenhaga ¿ em que conto ter um ou dois portugueses ¿ e está prevista a presença deles. Depois, haverá um jogo na África do Sul. Temos também marcada uma partida na Antárctica, algo muito entusiasmante para mim», conclui Pfannenstiel.