Um português encontra-se em qualquer canto do mundo. Até num país onde não há campeonato. Mesmo que esse português seja futebolista. Confuso? Ora atente: Tobias Guerreiro é alentejano, natural da vila de Pias e partiu de mãos dadas com os pais para a Suíça no início da década de 90.
Vive em Trübbach, estuda Direito em Saint-Gallen, respira a pureza dos Alpes e joga no FC Balzers, um dos mais típicos clubes do... Liechtenstein. O minúsculo Principado não possui condições estruturais para organizar uma liga nacional, daí que os principais emblemas tenham acesso aos campeonatos suíços.
Tobias atravessa a fronteira todos os dias, treina duas vezes por semana no país vizinho, mas é a Portugal que entrega o coração. «Representar a selecção era o meu maior sonho», diz ao Maisfutebol o atleta de 19 anos, antes de um breve lamento.
«A minha vida não fez o caminho planeado. Tive de cumprir 21 meses de serviço militar e atrasei a minha evolução. Reflecti e vou por toda a minha concentração nos estudos para garantir a minha segurança financeira no futuro.»
O FC Balzers milita no terceiro escalão da Suíça e o presidente chama-se Werner Frick. «Ele mora no estádio, faz de roupeiro, marca o campo e vive para o clube». O Balzers joga no Sportplatz Rheinau e «chega a ter 600 pessoas a ver os encontros». Para a realidade do Liechtenstein, um país com 30 mil habitantes, não é um número nada despiciendo.
Nem sempre foi assim, porém, a realidade de Tobias Guerreiro. Certa tarde, o luso-helvético chegou a actuar diante de dez mil pessoas... que estavam lá para ver outro jogo. «Fui jogar um torneio na Albânia com a seleccão sub-13 do Liechtenstein. O último jogo foi realizado uma hora antes da final da taça desse país. As bancadas ficaram repletas quando ainda estávamos em campo. Foi fantástico, mesmo sabendo que ninguém se interessava por nós», conta a sorrir.
Tobias, de resto, percebeu ter jeito para o futebol quando, no seu primeiro jogo, perdeu por 14-1 e fez o único golo da equipa. «Tinha seis anos e cheguei a casa todo contente. Não tinha noção das coisas. Chamavam-me o português e ninguém percebia o meu nome», recorda, enquanto prepara mais um regresso ao passado.
«Para eles o nome Guerreiro é estranhíssimo. Certa vez fui eleito o melhor jogador de um torneio. Um jornalista veio perguntar-me o nome e não percebia, não se acreditava. O meu pai teve de vir e garantir que eu não estava a pregar-lhe uma partida.»
As principais referências do Liechtenstein no futebol serão, do ponto de vista português, o mítico Mario Frick e o guarda-redes Peter Jehle, jogador do Boavista entre 2006 e 2008. O primeiro, agora com 37 anos, voltou ao seu país e é colega de equipa de Tobias. Frick actuou nove temporadas em Itália e dez na Suíça. Para as gentes do Liechtenstein é um deus.
«Que grande jogador! Pode dar muito aos jogadores jovens do país. Eu acho que um dia vai ser o selecionador nacional do Liechtenstein. Identifico-me totalmente com ele. Sou um médio tecnicamente forte, adoro o futebol bonito e só não sou muito forte fisicamente», diz Tobias Guerreiro.
«Aliás, essa pode outra das razões que explica o meu insucesso no futebol profissional. Seja como for, o futebol fará sempre parte da minha vida, na Suíça, no Liechtenstein ou em Portugal.»